Estudo apresenta múltiplas dimensões da pobreza que impactam crianças e adolescentes. Educação, renda e recursos para alimentação pioraram na pandemia
Foto: Arquivo/Agência Brasil
No
Acre, 83 de cada 100 crianças e adolescentes vivem na pobreza, em suas
múltiplas dimensões: renda, educação, trabalho infantil, moradia, água,
saneamento e informação. É o que indica a pesquisa "As Múltiplas Dimensões
da Pobreza na Infância e na Adolescência no Brasil", lançada nesta
terça-feira. O estudo apresenta dados até 2019 (trabalho infantil), até 2020
(moradia, água, saneamento e informação), até 2021 (renda, incluindo renda para
alimentação) e dados até 2022 (educação).
Neste
momento em que presidente, vice-presidente, ministros, governadores, senadores
e deputados iniciam novos mandatos, o UNICEF alerta para a urgência de
priorizar políticas públicas com recursos suficientes voltadas a crianças e
adolescentes no País, levando em consideração os desafios de cada região e
estado.
“A
pobreza na infância e na adolescência vai além da renda. Estar fora da escola,
viver em moradias precárias, não ter acesso a água e saneamento, não ter uma
alimentação adequada, estar em trabalho infantil e não ter acesso à informação
são privações que fazem com que crianças e adolescentes estejam na pobreza
multidimensional”, explica Liliana Chopitea, chefe de Políticas Sociais,
Monitoramento e Avaliação do UNICEF no Brasil. “Na maioria das vezes, essas
privações se sobrepõem, agravando os desafios enfrentados por cada menina e
menino. Por isso, é urgente olhar para a pobreza de forma ampla, e colocar a
infância e a adolescência no orçamento e no centro das políticas públicas”, defende
ela.
O
estudo foi realizado pelo UNICEF, com apoio da Fundação Vale. Para analisar a
pobreza multidimensional, foram utilizados dados oficiais, da Pnad Contínua,
relacionados a sete dimensões: Renda, Educação, Trabalho Infantil, Moradia,
Água, Saneamento e Informação. Além disso, foi realizada uma análise específica
sobre a renda para alimentação. Os resultados revelam um cenário preocupante. O
último ano para o qual há informações disponíveis para todos os indicadores é
2019 – quando havia 32 milhões de meninas e meninos de até 17 anos privados de
um ou mais desses direitos. Para os anos seguintes, só há dados de educação e
renda, incluindo renda para alimentação – e todos pioraram.
Em
2021, o percentual de crianças e adolescentes que viviam em famílias com renda
abaixo da linha de pobreza monetária extrema (menos de 1,9 dólar por dia)
alcançou o maior nível dos últimos cinco anos: 16,1%, versus 13,8%, em 2017. No
caso da alimentação, o contingente de crianças e adolescentes privados da renda
necessária para uma alimentação adequada passou de 9,8 milhões, em 2020, para
13,7 milhões, em 2021 – um salto de quase 40%. Já na educação, após anos em
queda, a taxa de analfabetismo dobrou de 2020 para 2022 – passado de 1,9% para
3,8%.
Desigualdade regional - A pobreza
multidimensional impactou mais quem já vivia em situação mais vulnerável –
negros e indígenas, e moradores das regiões Norte e Nordeste –, agravando as
desigualdades no País. Entre crianças e adolescentes negros e indígenas, 72,5%
estavam na pobreza multidimensional em 2019, versus 49,2% de brancos e
amarelos. Entre os estados, seis tinham mais de 90% de crianças e adolescentes
em pobreza multidimensional, todos no Norte e Nordeste.
Entre
as principais privações que impactam a infância e a adolescência no Brasil
estão a falta de acesso a saneamento básico (alcançando 21,2 milhões de meninas
e meninos), seguida pela privação de renda (20,6 milhões) e de acesso à
informação (6,2 milhões). A elas se somam a falta de moradia adequada (4,6
milhões), privação de educação (4,3 milhões), falta de acesso a água (3,4
milhões) e trabalho infantil (2,1 milhões). No total, são 32 milhões crianças e
adolescentes afetados por uma ou mais de uma dimensão da pobreza
multidimensional.
No
Acre, o estudo indica a falta de acesso a saneamento como a dimensão que mais
afeta crianças e adolescentes, impactando 66,8% de meninas e meninos, seguida
pela privação de renda (56,8%) e acesso à informação (25,7%). Em seguida vem
falta de acesso à água (24,3%), moradia (14,3%), privação de educação (11,6%) e
trabalho infantil (6,3%). No total, 83,4% das meninas e meninos do estado são
afetados por uma ou mais de uma dimensão da pobreza multidimensional.
“Os
desafios são imensos e inter-relacionados. Para reverter esse cenário, é
preciso políticas públicas que beneficiem não só as crianças e os adolescentes
diretamente, mas também mães, pais e responsáveis, especialmente os mais
vulneráveis”, afirma Liliana Chopitea.
O
UNICEF recomenda:
1.Priorizar investimentos em políticas sociais;
2.Ampliar a oferta de serviços e benefícios às crianças e aos(às)
adolescentes mais vulneráveis;
3.Fortalecer o Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do
Adolescente;
4.Implementar medições e o monitoramento das diferentes dimensões da
pobreza e suas privações por um órgão oficial do Estado;
5.Promover a segurança alimentar e nutricional de gestantes, crianças e
adolescentes, garantindo a eles(as) o direito humano à alimentação adequada e
reduzindo o impacto da fome e da má nutrição nas famílias mais empobrecidas;
6.Implantar com urgência políticas de busca ativa escolar e retomada da
aprendizagem, em especial da alfabetização;
7.Priorizar, no âmbito das respectivas esferas de gestão, a agenda de água
e saneamento para o desenvolvimento e implementação de políticas públicas;
8.Implementar formas de identificar precocemente as famílias vulneráveis a
violências, incluindo trabalho infantil;
9.Promover e fortalecer oportunidades no ambiente escolar e na transição
de adolescentes para o mercado de trabalho.
Confira,
abaixo, a situação do Brasil nas dimensões que compõem a pobreza
multidimensional.
Renda
Até
2019, a privação de renda se mantinha relativamente estável no Brasil, com mais
de 20 milhões de meninas e meninos vivendo abaixo de um nível mínimo de renda
para satisfazer suas necessidades.
Em
2020, com o Auxílio Emergencial, houve uma melhora no percentual de crianças e
adolescentes vivendo na extrema pobreza (renda familiar inferior a 1,9 dólar
por dia). Esse cenário, no entanto, não se manteve em 2021. O percentual de
crianças e adolescentes vivendo na extrema pobreza, e também na pobreza (renda
familiar de menos de 5 dólares por dia), alcançou o maior nível em relação aos
anos anteriores: 16,1% e 26,2%, respectivamente.
Alimentação
Na última década, o número de crianças e adolescentes que viviam em domicílios
cuja renda familiar era insuficiente para alimentação vinha sendo reduzido. A
pandemia, no entanto, reverteu essa tendência de melhora, alterando bastante o
cenário.
Entre
2020 e 2021, o número de crianças e adolescentes privados de renda familiar
necessária para uma alimentação adequada passou de 9,8 milhões para 13,7
milhões. Um aumento de 3,9 milhões. Os percentuais de privação subiram tanto
para negros e indígenas quanto para brancos e amarelos. O aumento, no entanto,
foi maior para o primeiro grupo (31,2%% ante 17,8%), aprofundando a desigualdade.
Educação
Em 2019, mais de 4 milhões de crianças e
adolescentes apresentavam alguma privação no direito à educação no Brasil –
frequentavam a escola com atraso escolar ou sem estar alfabetizados, ou estavam
fora da escola.
Se,
antes da pandemia, o País vinha apresentando pequenas melhorias no acesso a
esse direito, com a pandemia, o cenário se inverteu. Houve piora em diferentes
indicadores, em especial a alfabetização. Em 2022, o percentual de crianças
privadas do direito à alfabetização dobrou em relação a 2020, passando de 1,9%
para 3,8%. A privação de alfabetização impacta diretamente a aprendizagem e a
trajetória escolar dos(as) estudantes, afetando principalmente crianças e
adolescentes negros e indígenas, das regiões Norte e Nordeste e meninos.
Saneamento
A falta de acesso ao saneamento – banheiro e rede
de esgoto – é uma das privações que mais impactam crianças e adolescentes no
Brasil. Segundo os dados da Pnad Contínua 2020 (últimos disponíveis para esse
tema), quatro em cada dez meninas e meninos estavam privados desse direito.
Há
quase o dobro de crianças e adolescentes negros e indígenas privados do direito
ao saneamento no Brasil, em comparação com brancos e amarelos – 47% e 29,7%,
respectivamente. O problema é mais grave nas regiões Norte e Nordeste, em que
há estados com mais de 80% das crianças e dos adolescentes privados de
saneamento.
Água
De modo geral, os percentuais de meninos e meninas
privados do acesso a água segura se mantiveram estáveis nos últimos anos.
Houve, apenas, uma melhora em 2020 em relação ao cenário mais extremo dessa
privação de direito. Com isso, o percentual de crianças e adolescentes que
habitavam um domicílio que não recebia água canalizada caiu de 4,6%, em 2017,
para 3,5%, em 2020. Já os percentuais de quem recebia água, mas de fonte
insegura, ou tinha água apenas na parte externa da casa, se manteve estável.
Moradia
Aproximadamente um em cada dez crianças e
adolescentes vive em moradia inadequada no Brasil – viver em uma casa com
quatro pessoas por dormitório, ou cujas paredes são de material inadequado,
como madeira aproveitada. Os dados mais recentes disponíveis são de 2020. O
problema se concentra no Norte do País, com três estados apresentando
indicadores de moradia inadequada superiores a 20% – Amazonas, Amapá e Roraima.
E está presente de forma mais acentuada, também, em grandes conglomerados
urbanos, como São Paulo e Rio de Janeiro, que, apesar dos altos níveis de
desenvolvimento socioeconômico, têm mais de 10% das crianças e dos adolescentes
vivendo em moradias inadequadas.
Informação
O acesso à internet e à televisão, especialmente o
primeiro, apresentou uma melhora estatisticamente significativa nos últimos
anos. De 2017 a 2020, o percentual de crianças e adolescentes que acessou a
internet em casa no ano anterior à realização da pesquisa (Pnad-C) passou de
67,9% para 86,6%.
Os
resultados mostram, no entanto, que o acesso a essas tecnologias é ainda muito
desigual no País. O percentual de negros e indígenas privados desse direito é
quase o dobro em comparação com brancos e amarelos, em todos os anos. A
disparidade regional também é grande, com percentuais de privação abaixo de 5%
no Sul e Sudeste, e ultrapassando 20% em alguns estados do Norte e Nordeste.
Trabalho infantil
Os últimos dados disponíveis sobre trabalho
infantil na Pnad Contínua são de 2019. Naquele ano, mais de 2 milhões de
crianças e adolescentes de 5 a 17 anos estavam em situação de trabalho infantil
no Brasil – excluindo-se aqui meninas e meninos exercendo função de aprendiz,
prevista em lei. Entre 2017 e 2019, não houve melhorias significativas nessa
área.
Sobre o Estudo
A pesquisa "As Múltiplas Dimensões da Pobreza
na Infância e na Adolescência no Brasil" foi realizada pelo UNICEF, com
apoio da Fundação Vale. A pesquisa utiliza dados oficiais do Brasil. Para
desenhar o cenário atual, foi utilizada a Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios Contínua (Pnad Contínua) de 2017 a 2019/2020/2021/2022, dependendo
da disponibilidade. A análise histórica foi feita com base na Pesquisa de Orçamentos
Familiares (POF) 2008/2009 e 2017/2018. A POF foi utilizada, também, para
analisar a dimensão de alimentação, que não é coberta de maneira sistemática
pela Pnad Contínua. Em virtude das restrições impostas pela pandemia de
covid-19, determinados indicadores, como trabalho infantil, não foram
atualizados.
Além
de mapear as múltiplas dimensões da pobreza – alimentação, renda, educação,
trabalho infantil, moradia, água, saneamento e informação –, o estudo
categoriza as privações em intermediária (acesso ao direito de maneira limitada
ou com má qualidade) e extrema (sem nenhum acesso ao direito), de acordo com
critérios como faixa etária, dados disponíveis e legislação do País. Há também
análises por estado, cor/raça e gênero.
A
Fundação Vale atua visando contribuir para a garantia de direitos de crianças e
adolescentes, especialmente nas áreas da educação e da saúde. Foi nesse
contexto que apoiou a realização deste importante estudo. “Acreditamos que o
investimento social privado tem uma relevante contribuição a dar também no
combate à pobreza, especialmente quando realizado em parceria com o poder
público, instituições da sociedade civil e corporações, no sentido de
fortalecer as políticas públicas sociais. Para isso, tem sido fundamental
aprofundar a compreensão da pobreza como um fenômeno multidimensional e lançar
um olhar focalizado para as pessoas que têm sido, sistematicamente, deixadas
para trás. O estudo nos ajuda nesse processo e permite verificar como a pobreza
impacta de forma ainda mais severa as crianças e os adolescentes”, afirma
Flávia Constant, diretora-presidente da Fundação Vale.
Estudo apresenta múltiplas dimensões da pobreza que impactam crianças e adolescentes. Educação, renda e recursos para alimentação pioraram na pandemia
No Acre, 83 de cada 100 crianças e adolescentes vivem na pobreza, em suas múltiplas dimensões: renda, educação, trabalho infantil, moradia, água, saneamento e informação. É o que indica a pesquisa "As Múltiplas Dimensões da Pobreza na Infância e na Adolescência no Brasil", lançada nesta terça-feira. O estudo apresenta dados até 2019 (trabalho infantil), até 2020 (moradia, água, saneamento e informação), até 2021 (renda, incluindo renda para alimentação) e dados até 2022 (educação).
Neste momento em que presidente, vice-presidente, ministros, governadores, senadores e deputados iniciam novos mandatos, o UNICEF alerta para a urgência de priorizar políticas públicas com recursos suficientes voltadas a crianças e adolescentes no País, levando em consideração os desafios de cada região e estado.
“A pobreza na infância e na adolescência vai além da renda. Estar fora da escola, viver em moradias precárias, não ter acesso a água e saneamento, não ter uma alimentação adequada, estar em trabalho infantil e não ter acesso à informação são privações que fazem com que crianças e adolescentes estejam na pobreza multidimensional”, explica Liliana Chopitea, chefe de Políticas Sociais, Monitoramento e Avaliação do UNICEF no Brasil. “Na maioria das vezes, essas privações se sobrepõem, agravando os desafios enfrentados por cada menina e menino. Por isso, é urgente olhar para a pobreza de forma ampla, e colocar a infância e a adolescência no orçamento e no centro das políticas públicas”, defende ela.
O estudo foi realizado pelo UNICEF, com apoio da Fundação Vale. Para analisar a pobreza multidimensional, foram utilizados dados oficiais, da Pnad Contínua, relacionados a sete dimensões: Renda, Educação, Trabalho Infantil, Moradia, Água, Saneamento e Informação. Além disso, foi realizada uma análise específica sobre a renda para alimentação. Os resultados revelam um cenário preocupante. O último ano para o qual há informações disponíveis para todos os indicadores é 2019 – quando havia 32 milhões de meninas e meninos de até 17 anos privados de um ou mais desses direitos. Para os anos seguintes, só há dados de educação e renda, incluindo renda para alimentação – e todos pioraram.
Em 2021, o percentual de crianças e adolescentes que viviam em famílias com renda abaixo da linha de pobreza monetária extrema (menos de 1,9 dólar por dia) alcançou o maior nível dos últimos cinco anos: 16,1%, versus 13,8%, em 2017. No caso da alimentação, o contingente de crianças e adolescentes privados da renda necessária para uma alimentação adequada passou de 9,8 milhões, em 2020, para 13,7 milhões, em 2021 – um salto de quase 40%. Já na educação, após anos em queda, a taxa de analfabetismo dobrou de 2020 para 2022 – passado de 1,9% para 3,8%.
Desigualdade regional - A pobreza multidimensional impactou mais quem já vivia em situação mais vulnerável – negros e indígenas, e moradores das regiões Norte e Nordeste –, agravando as desigualdades no País. Entre crianças e adolescentes negros e indígenas, 72,5% estavam na pobreza multidimensional em 2019, versus 49,2% de brancos e amarelos. Entre os estados, seis tinham mais de 90% de crianças e adolescentes em pobreza multidimensional, todos no Norte e Nordeste.
Entre as principais privações que impactam a infância e a adolescência no Brasil estão a falta de acesso a saneamento básico (alcançando 21,2 milhões de meninas e meninos), seguida pela privação de renda (20,6 milhões) e de acesso à informação (6,2 milhões). A elas se somam a falta de moradia adequada (4,6 milhões), privação de educação (4,3 milhões), falta de acesso a água (3,4 milhões) e trabalho infantil (2,1 milhões). No total, são 32 milhões crianças e adolescentes afetados por uma ou mais de uma dimensão da pobreza multidimensional.
No Acre, o estudo indica a falta de acesso a saneamento como a dimensão que mais afeta crianças e adolescentes, impactando 66,8% de meninas e meninos, seguida pela privação de renda (56,8%) e acesso à informação (25,7%). Em seguida vem falta de acesso à água (24,3%), moradia (14,3%), privação de educação (11,6%) e trabalho infantil (6,3%). No total, 83,4% das meninas e meninos do estado são afetados por uma ou mais de uma dimensão da pobreza multidimensional.
“Os desafios são imensos e inter-relacionados. Para reverter esse cenário, é preciso políticas públicas que beneficiem não só as crianças e os adolescentes diretamente, mas também mães, pais e responsáveis, especialmente os mais vulneráveis”, afirma Liliana Chopitea.
O UNICEF recomenda:
1. Priorizar investimentos em políticas sociais;
2. Ampliar a oferta de serviços e benefícios às crianças e aos(às) adolescentes mais vulneráveis;
3. Fortalecer o Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente;
4. Implementar medições e o monitoramento das diferentes dimensões da pobreza e suas privações por um órgão oficial do Estado;
5. Promover a segurança alimentar e nutricional de gestantes, crianças e adolescentes, garantindo a eles(as) o direito humano à alimentação adequada e reduzindo o impacto da fome e da má nutrição nas famílias mais empobrecidas;
6. Implantar com urgência políticas de busca ativa escolar e retomada da aprendizagem, em especial da alfabetização;
7. Priorizar, no âmbito das respectivas esferas de gestão, a agenda de água e saneamento para o desenvolvimento e implementação de políticas públicas;
8. Implementar formas de identificar precocemente as famílias vulneráveis a violências, incluindo trabalho infantil;
9. Promover e fortalecer oportunidades no ambiente escolar e na transição de adolescentes para o mercado de trabalho.
Confira, abaixo, a situação do Brasil nas dimensões que compõem a pobreza multidimensional.
Renda
Até 2019, a privação de renda se mantinha relativamente estável no Brasil, com mais de 20 milhões de meninas e meninos vivendo abaixo de um nível mínimo de renda para satisfazer suas necessidades.
Em 2020, com o Auxílio Emergencial, houve uma melhora no percentual de crianças e adolescentes vivendo na extrema pobreza (renda familiar inferior a 1,9 dólar por dia). Esse cenário, no entanto, não se manteve em 2021. O percentual de crianças e adolescentes vivendo na extrema pobreza, e também na pobreza (renda familiar de menos de 5 dólares por dia), alcançou o maior nível em relação aos anos anteriores: 16,1% e 26,2%, respectivamente.
Alimentação
Na última década, o número de crianças e adolescentes que viviam em domicílios cuja renda familiar era insuficiente para alimentação vinha sendo reduzido. A pandemia, no entanto, reverteu essa tendência de melhora, alterando bastante o cenário.
Entre 2020 e 2021, o número de crianças e adolescentes privados de renda familiar necessária para uma alimentação adequada passou de 9,8 milhões para 13,7 milhões. Um aumento de 3,9 milhões. Os percentuais de privação subiram tanto para negros e indígenas quanto para brancos e amarelos. O aumento, no entanto, foi maior para o primeiro grupo (31,2%% ante 17,8%), aprofundando a desigualdade.
Educação
Em 2019, mais de 4 milhões de crianças e adolescentes apresentavam alguma privação no direito à educação no Brasil – frequentavam a escola com atraso escolar ou sem estar alfabetizados, ou estavam fora da escola.
Se, antes da pandemia, o País vinha apresentando pequenas melhorias no acesso a esse direito, com a pandemia, o cenário se inverteu. Houve piora em diferentes indicadores, em especial a alfabetização. Em 2022, o percentual de crianças privadas do direito à alfabetização dobrou em relação a 2020, passando de 1,9% para 3,8%. A privação de alfabetização impacta diretamente a aprendizagem e a trajetória escolar dos(as) estudantes, afetando principalmente crianças e adolescentes negros e indígenas, das regiões Norte e Nordeste e meninos.
Saneamento
A falta de acesso ao saneamento – banheiro e rede de esgoto – é uma das privações que mais impactam crianças e adolescentes no Brasil. Segundo os dados da Pnad Contínua 2020 (últimos disponíveis para esse tema), quatro em cada dez meninas e meninos estavam privados desse direito.
Há quase o dobro de crianças e adolescentes negros e indígenas privados do direito ao saneamento no Brasil, em comparação com brancos e amarelos – 47% e 29,7%, respectivamente. O problema é mais grave nas regiões Norte e Nordeste, em que há estados com mais de 80% das crianças e dos adolescentes privados de saneamento.
Água
De modo geral, os percentuais de meninos e meninas privados do acesso a água segura se mantiveram estáveis nos últimos anos. Houve, apenas, uma melhora em 2020 em relação ao cenário mais extremo dessa privação de direito. Com isso, o percentual de crianças e adolescentes que habitavam um domicílio que não recebia água canalizada caiu de 4,6%, em 2017, para 3,5%, em 2020. Já os percentuais de quem recebia água, mas de fonte insegura, ou tinha água apenas na parte externa da casa, se manteve estável.
Moradia
Aproximadamente um em cada dez crianças e adolescentes vive em moradia inadequada no Brasil – viver em uma casa com quatro pessoas por dormitório, ou cujas paredes são de material inadequado, como madeira aproveitada. Os dados mais recentes disponíveis são de 2020. O problema se concentra no Norte do País, com três estados apresentando indicadores de moradia inadequada superiores a 20% – Amazonas, Amapá e Roraima. E está presente de forma mais acentuada, também, em grandes conglomerados urbanos, como São Paulo e Rio de Janeiro, que, apesar dos altos níveis de desenvolvimento socioeconômico, têm mais de 10% das crianças e dos adolescentes vivendo em moradias inadequadas.
Informação
O acesso à internet e à televisão, especialmente o primeiro, apresentou uma melhora estatisticamente significativa nos últimos anos. De 2017 a 2020, o percentual de crianças e adolescentes que acessou a internet em casa no ano anterior à realização da pesquisa (Pnad-C) passou de 67,9% para 86,6%.
Os resultados mostram, no entanto, que o acesso a essas tecnologias é ainda muito desigual no País. O percentual de negros e indígenas privados desse direito é quase o dobro em comparação com brancos e amarelos, em todos os anos. A disparidade regional também é grande, com percentuais de privação abaixo de 5% no Sul e Sudeste, e ultrapassando 20% em alguns estados do Norte e Nordeste.
Trabalho infantil
Os últimos dados disponíveis sobre trabalho infantil na Pnad Contínua são de 2019. Naquele ano, mais de 2 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos estavam em situação de trabalho infantil no Brasil – excluindo-se aqui meninas e meninos exercendo função de aprendiz, prevista em lei. Entre 2017 e 2019, não houve melhorias significativas nessa área.
Sobre o Estudo
A pesquisa "As Múltiplas Dimensões da Pobreza na Infância e na Adolescência no Brasil" foi realizada pelo UNICEF, com apoio da Fundação Vale. A pesquisa utiliza dados oficiais do Brasil. Para desenhar o cenário atual, foi utilizada a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) de 2017 a 2019/2020/2021/2022, dependendo da disponibilidade. A análise histórica foi feita com base na Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2008/2009 e 2017/2018. A POF foi utilizada, também, para analisar a dimensão de alimentação, que não é coberta de maneira sistemática pela Pnad Contínua. Em virtude das restrições impostas pela pandemia de covid-19, determinados indicadores, como trabalho infantil, não foram atualizados.
Além de mapear as múltiplas dimensões da pobreza – alimentação, renda, educação, trabalho infantil, moradia, água, saneamento e informação –, o estudo categoriza as privações em intermediária (acesso ao direito de maneira limitada ou com má qualidade) e extrema (sem nenhum acesso ao direito), de acordo com critérios como faixa etária, dados disponíveis e legislação do País. Há também análises por estado, cor/raça e gênero.
A Fundação Vale atua visando contribuir para a garantia de direitos de crianças e adolescentes, especialmente nas áreas da educação e da saúde. Foi nesse contexto que apoiou a realização deste importante estudo. “Acreditamos que o investimento social privado tem uma relevante contribuição a dar também no combate à pobreza, especialmente quando realizado em parceria com o poder público, instituições da sociedade civil e corporações, no sentido de fortalecer as políticas públicas sociais. Para isso, tem sido fundamental aprofundar a compreensão da pobreza como um fenômeno multidimensional e lançar um olhar focalizado para as pessoas que têm sido, sistematicamente, deixadas para trás. O estudo nos ajuda nesse processo e permite verificar como a pobreza impacta de forma ainda mais severa as crianças e os adolescentes”, afirma Flávia Constant, diretora-presidente da Fundação Vale.
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